A primeira exposição, sobre fotografia e cinema - "O cinema são 24 fotogramas por segundo." - mostrava algumas das minhas dores pessoais. Dores que não nasceram comigo. Dores que fui acumulando, com mérito, graças à minha personalidade, ao longo dos anos. Por erros, más decisões, impulsos, incapacidade, impaciência, insuficiências, enfim, falhas minhas. São dorzinhas, no fundo. Com estas eu posso bem.
Soube bem vê-las ali expostas, identificá-las, olhá-las nos olhos.
Saí de lá mais aconchegada, não tão sozinha. Tinha o sábado feito.
Rumei à segunda exposição.
Não sabia para o que ia.
A frase logo na entrada, captou imediatamente a minha atenção. Li. Desviei. Voltei a ler. Apeteceu-me roubá-la. Mas mal os meus olhos fixaram a primeira fotografia, tudo de esvaiu.
A cada fotografia que via, cada texto que as acompanhava lido, a sensação de aconchego desaparecia, dando lugar às dores grandes. As dores com as quais não consigo lidar, compreender ou aceitar. Aquelas que têm génese na minha condição de ser humana e que nasceram comigo. Dizem que me purificaram no baptismo. Mas eu nunca as deixei de sentir. Todos os dias as sinto: naquele que faz uso da sua superioridade (física e/ou intelectual) para maltratar/humilhar o próximo, naquele que espanca a mulher e/ou os filhos, na mulher que não se defende daquele que a espanca ou, pior!, não defende os próprios filhos, naquele que faz a guerra, naqueles que sofrem com a guerra, naqueles que passam fome, naqueles que esbanjam, naqueles que sofrem a injustiça, nos massacres levados a cabo em nome de um deus... Mas, e acima de tudo, na nossa indiferença, no nosso egoísmo.
E de que me vale sofrer muito com tudo isto se nada faço para que as coisas mudem? Roça a hipocrisia. Quase como se fosse indigna de as sentir.
Felizmente há quem faça algo.
E há quem as mostre.
O ser humano é este ser fantástico, querendo, capaz de coisas incríveis, capaz de se superar.
E à minha frente, ali estavam aqueles seres, verdadeiros humanos, no seu maior esplendor.
Se a cada dia que passa, eu cada vez mais perco a esperança na humanidade, a cada dia que passa descubro alguém que me a devolve.
Hei-de voltar a esta exposição. Hei-de registá-la. E hei-de lembrar-me dela, sempre que estiver à beira de ter um chelique de gaja.
Mas, se eu me esquecer, por favor, lembrem-me.