Quase sufoco nas próprias lágrimas. Naquelas que não consigo chorar. Porque estou impedida de viver. Sempre estive.
Inacessível, isolada no alto da minha torre, limito-me a viver a vida dos outros.
Não tenho vida. Uma que possa chamar minha. Esta, não me pertence.
Fiz-me bela, encantadora e perfeita. E assim me querem.
Sou sonho de quem passa e nunca fica. Mulher, de ninguém. Porque não tenho forma. Sou ideia que corre e escorre, sem ficar e sem se concretizar.
Não me é permitido ser triste. Triste, só sendo ingrata. Porque moro num castelo, porque sou bela, porque tenho tudo sem nada ter. E, um sorriso assim, não pode andar escondido.
Deito-o somente quando anoitece e apago a luz dos meus olhos.
Queria dormir. Mas sempre que adormeço, sonho. Sonho que me libertam deste conto e me dão vida.
Observo quem passa.
Vejo um casal apaixonado. Conheço-os bem. Moram aqui perto.
Separaram-se há tempos e reencontraram-se agora, neste preciso momento.
Partilham um amor que já não existe mas que ficou.
Ela, luz dos olhos dele. E ele, vida que é a dela.
Passeiam-se agora, neste preciso momento, por baixo da minha janela. Mais felizes do que nunca.
Agora que sabem que separados não vivem, prometem nunca mais se separar.
Este reencontro comove-me.
Finalmente pude chorar. Lágrimas que curaram a minha cegueira.
Este é o amor que quero para mim. Um amor tão imperfeito quando verdadeiro. Porque... muitos podem ser sonhados, mas só estes podem ser vividos.